Na década de 80, o turfe carioca viveu o “efeito Itajara”. Desde a sua
estreia, com a tradicional farda dos Haras São José e Expedictus, demonstrou
que não era um puro-sangue comum. Os matinais do prado carioca paravam para
assistir os seus treinos. Itajara não se fazia de rogado e quebrava os
relógios. Nas competições nem dava bola para os rivais e massacrava os seus
adversários. No programa “Fantástico”, da TV Globo, nas noites de domingo, o
incomparável locutor Ernani Pires Ferreira transformava as suas exibições
extraordinárias nas pistas em feitos impossíveis, dignos de um fenômeno.
Itajara recebeu atenção especial da mídia. Tudo bem, ele merecia. Mas se ele
estreasse nos tempos atuais seria difícil que conseguisse arrastar as multidões
ao Hipódromo da Gávea, como aconteceu naqueles tempos gloriosos.
Toda semana, a gente presencia os craques realizarem coisas notáveis pelo mundo afora. E a mídia internacional aproveita para explorar cada migalha desta façanha. O esporte movimente milhões de dólares e euros graças aos esportistas acima da média. O turfe chegou ao século 21 sem aprender esta lição. João Moreira foi embora para o outro lado do planeta. Nem esmo o genial apelido de “Fantasma de Cidade Jardim”, dado pelo brilhante Roberto Casella, locutor oficial do turfe paulista, permitiu uma maior sensibilidade dos dirigentes para explorar aquele futuro fenômeno de mídia. Hoje, no oriente, o nosso fantasminha virou Magic Moreira.
O mesmo aconteceu no turfe carioca. Jorge Ricardo reinou por 24 anos na liderança da estatística carioca e depois de levar o esporte aos programas mais populares e reconhecidos da televisão brasileira, entre eles, Jô Soares, Marília Gabriela entrevista, Sem Censura, Globo Esporte, Tá na Área, entre outros, transferiu-se para o turfe argentino numa silenciosa tarde chuvosa, com menos de 20 pessoas na Tribuna Social do hipódromo carioca. E, com uma agravante. O gerente de marketing do clube, ao ser perguntado se ele não merecia homenagem, respondeu simplesmente que não ia colocar azeitona na empada de ninguém.
Quase 30 anos depois de Itajara surgiu Bal A Bali, criado pelo Haras Santa Maria de Araras, de Júlio Bozano, e coma farda do Stud Alvarenga, de Álvaro Novis. Duas potências. E nem assim, este cavalo com 11 vitórias em 12 saídas no Brasil. A única derrota aconteceu devido a uma dor de canela, recebeu o carinho que merecia. Um cavalo desta magnitude em solo americano é transformado de forma imediata em herói. Basta ver que Secretariat e Sea Biscuit motivaram os cineastas a fazerem dois belos filmes. Jóqueis da categoria de Jorge Ricardo e João Moreira são considerados como estrelas de primeira grandeza com status de atores de Hollywood.
Enquanto as arquibancadas dos hipódromos estiverem vazias. Enquanto os nossos protagonistas não tiverem tratamento especial. Enquanto os dirigentes não deixarem as vaidades pessoais, os interesses políticos e econômicos de lado. Enquanto os criadores e proprietários não estiverem unidos. Enquanto o produto tão bom da nossa criação (cavalo de corrida) não merecer aquilo de melhor que lhe é de direito. Enquanto a administração do turfe for amadora. Enquanto os dirigentes pensarem pequeno e não assumirem a gestão e o comprometimento com a atividade que promovem. Enquanto tudo isso e mais um pouco não for feito. O nosso turfe não vai a lugar algum em termos de atividade lucrativa e econômica.
A gente vai ter que continuar a bater palmas para os americanos. Eles sabem muito bem o valor inestimável dos homens e cavalos de exceção na vida turfística. Eles sabem promover o show. E para valorizar um show a presença das estrelas é sempre indispensável. Só as estrelas, os ídolos, os privilegiados de Deus arrastam as multidões de fariseus. Bal A Bali agora vai dar autógrafo na Califórnia e em Nova Iorque. E talvez, em pouco tempo, até esteja cotado para ter o seu nome escrito no Hall da Fama.
Paulo Gama
Transcrito do Site Raia Leve.